Tela: Artista Cido Oliveira - Árvores alagadas

 

 

 

 

Vera Pessoa

 

Sonhei que a consciência, ou o pressentimento doloroso da separação entre amantes ia até às raízes das dores da alma, desencadeando o que tanto atormenta todo o ser humano, a angústia. E que esse fenômeno se tornava tanto mais frenquente quanto o homem se afastava da natureza. Mas que esse afastamento constituía destino e história do homem.

Acordei assustada, e então hipotetizei que embora o homem tenha vocação e teoria parece que essas contêm, em si mesmas, a dúvida relativamente à sua própria possibilidade.

Todavia, perguntei-me, como poderia o homem efetivamente viver com a experiência da separação? Separação daquele amor que fantasiava ser o eterno e separação da natureza? Evidentemente ele poderia, na medida em que vivesse, na melhor das hipóteses, numa eterna luta pra se distanciar de uma possível morte, buscando objetivos de vida.E provavelmente, ai estaria o sentido da elaboração do sofrido luto.

Agora bem lúcida, mergulhei em minhas reflexões e me questionei: e se a elaboração do luto não se concretizar o que poderá ocorrer? A melancolia, tristemente respondi pra mim mesma! Assim, vivendo a melancolia não se poderá trabalhar o luto...

Parece-nos que a criança e o adolescente, por suas tenras idades, encontram-se muito e mais perto da natureza (a própria e a do universo). E o adulto cada vez mais se afasta da mesma, porque aos poucos vai sentindo, compreendendo e aceitando que não há como contrabalançar a separação. Dizia pra mim mesma: creio que esses fenômenos podem ocorrer quanto menos mecanismos de defesas são vivenciados por este ser vivido.

Ele perceberá que, após ter passado por inúmeras separações de objetos de amor, deverá a partir de determinado momento ir experienciando a sensação de se separar de si mesmo. E o ditado popular, “a morte tem início no momento do nascimento”, pulsa nas suas têmporas.

Cada qual morre à sua maneira à própria morte existencial. Cada qual se separa dos seus laços afetivos à sua maneira. Cada qual viverá do seu jeito a sensação de estar integrado ao social, em especial o ocidental, sem sentidos verdadeiros. Cada qual, à própria maneira, se separa de si mesmo, diante de todas essas realidades.

Por isso mesmo, a elaboração da morte - decorrente da separação do pretenso amor eterno -, desencadeará a defesa contra a consciência da separação. Separação apenas aparente que irá fomentar, por incrível que pareça, a sociabilidade. Sociabilidade, a bem da verdade, que se trata de uma defesa opressora e até certo ponto conformista: que além do mais em nada ajudará a vencer os sentimentos de morte, a luta contra a separação.

Como exemplo plausível do que acabamos de afirmar, basta olharmos à nossa volta e vermos a enorme e diversificada quantidade de redes de relacionamento.

 

São Paulo, 10.IX.2013

 

 

 

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Música: Johann Sebastian Bach (Eisenach, 1685 - Leipzig, 1750)

"Air" aus Ouverture
(Orchester suite) nº 3 (D-Dur, BWV 1068), 2nd movement

 

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