Vera Pessoa
É muito
sofrido tentarmos aceitar e adequarmo-nos ao que percebemos em
relação à sociedade brasileira capitalista contemporânea. Ela tem
despertado novos significados e valores às pessoas e os transmutado
para o pior em relação a nossa época de criança e adolescência. Em
outros tempos, o significado dos vínculos humanos e datas festivas,
por exemplo, eram apreendidos verdadeiramente afetivos, respeitosos,
valorosos e alguns eram vistos como transcendentes e divinos.
O
significado de igualdade entre os homens, por exemplo, vem
sendo usado e abusado como comportamento construtivo e verdadeiro,
levando-os a se comportarem como robôs e a perderem as suas
individualidades físicas (emoção, alma, cognição) e espirituais.
Vemos hoje o conceito de igualdade sendo encarado como uniformidade
e não unidade!
Algumas
pessoas somente representam-se nas comemorações, como no Natal,
deixando-se envolver pelo comportamento social uniforme de
autoengano, auto piedade e glutoneria. Oferecem ao outro um afeto
falso brilhante e nenhuma e/ou verdadeira comemoração do nascimento
de quem deveria ser o dono da festa – Jesus Cristo. Comprometem-se à
fantasiosa uniformidade social de alegria; do que se é e do que se
tem; da democratização do conhecimento e da sabedoria. As pessoas
estão se perdendo de si mesmas e o valor da construção genuína da
unidade humana. Colocam em último lugar a criação da essência da
pessoa humana: a formação dos laços afetivos. Estão abandonando a
leitura e a reflexão de livros – em especial a Bíblia Sagrada – que
edifica o homem (há pouco tempo ouvi de pessoas que escrevem que
nunca haviam lido um livro literário e, menos ainda, um voltado a
qualquer área do conhecimento).
Pergunto-me: Estamos nos tornando naturalmente e com grande
facilidade autodidatas, “inteligentes”, “cultos”, emocionalmente bem
resolvidos, desenvolvidos em todos os aspectos e cognitivamente
acima do “normal” - “gênios”? Estamos todos nós recebendo similar e
simultaneamente os mesmos comandos das diversificadas partes do
cérebro, do meio ambiente e do universo sem termos consciência das
ocorrências desses fenômenos? E esses ganhos estão ocorrendo na
mesma intensidade, na mesma dinâmica, no mesmo colorido, no mesmo
ritmo, na mesma melodia e na mesma qualidade?
Estamos
em conjunto e igualmente, a anos luz, influenciados pelo que
o suíço Carl Gustav Jung, discípulo de Freud,
definiu como arquétipo? Para Jung, os arquétipos são conjuntos de
“imagens primordiais” originadas de uma repetição progressiva de uma
mesma experiência durante muitas gerações, armazenadas no
inconsciente coletivo.
Segundo
Mark e Pearson, os arquétipos descritos em O Herói e o
Fora-da-Lei são exemplos de algumas figuras que todos nós temos
no imaginário desde criança - independentemente de onde fomos
criados, do país que vivemos e das nossas religiões e crenças. É por
isso que os arquétipos estão presentes nos mitos, nas lendas e nos
contos de fadas. São eles que dão o verdadeiro significado para as
histórias que passamos de geração em geração. Afinal de contas, as
pessoas criam essas histórias para externar o que existe no
inconsciente? Os arquétipos ajudam-nos a satisfazer algumas de
nossas principais necessidades como a imprescindibilidade de
realização, de pertença, de independência e de estabilidade.
É
interessante observarmos que o livro citado – voltado ao mundo dos
negócios e do marketing - nos mostra como construir marcas
extraordinárias usando o poder dos arquétipos. O Herói e o Fora
da Lei oferece um sistema claramente estruturado que todos os
profissionais dos focados mundos poderão seguir e reproduzir usando
apenas o poder dos arquétipos. “Os leitores aprenderão como
compreender o significado profundo da categoria do seu produto e
‘reivindicá-la’ para a sua marca; como avaliar o panorama
competitivo a partir de uma perspectiva arquetípica; como ligar-se
mais profundamente aos clientes; e como contar a história de sua
marca de modo a evocar os padrões narrativos mais duradouros e
apreciados no mundo todo”.
Ah, e a
aprendizagem e o fortalecimento dos laços afetivos entre as pessoas
(bebês, crianças, adultos e famílias) - que são cientificamente
estudados - onde os colocamos nas prioridades sociais?
Bem,
ressaltei acima o “que não sentíamos” necessidade de dizer ao
rascunhar este texto. Pretendo e quero salientar somente o cuidado
que devemos ter - até mesmo encararmos com um certo ceticismo –
diante das alterações de afeto e da espiritualidade na festividade
que o homem tem comemorado com tanto vigor econômico e emocional: o
Natal! Formas de comemorações que vêm a ocorrer com crescente, até
entre nós cristãos, desnorteando-nos das orientações da Sagrada
Escritura, a Bíblia. Alterações apostoladas e praticadas como sendo
a união entre os membros familiares, estimulando-as a se formarem em
clãs!
Mesmo
tendo o conhecimento de que Jesus Cristo não nasceu na data em que
se comemora o Seu nascimento (segundo descrições na Bíblia e relatos
científicos), soam, com profunda tristeza, algumas práticas que
estão sendo adotadas também em muitas das nossas igrejas evangélicas:
(1) se o culto é realizado no dia do Natal, após o seu encerramento,
as pessoas saem correndo da igreja para irem à ceia em suas casas (indago:
as pessoas estavam inteiramente presentes ao culto?); (2) há pessoas
que nem vão à igreja porque foi suspenso o culto natalino; (3)
muitos membros das igrejas que são solitários continuam a passar
sozinhos as horas natalinas festejadas com comidas e presentes pelos
“irmãos” das igrejas...!
Na
nossa época de criança e adolescência, a comemoração do Natal era
realmente alegre, festiva. Tínhamos os belos cânticos natalinos
interpretados por corais, individualmente, por grupos e pela
congregação. Havia dramatizações sobre o nascimento de Jesus, a
anunciação da Palavra por um Pastor etc. E, na própria igreja,
participávamos da ceia natalina após o Culto. Esta era organizada/confeccionada/criada
pelos membros da igreja, ou cada um levava ao grupo um prato
simples, mas muito saboroso! Os amigos também eram convidados a
participarem desse afetivo jantar.
Ah, era aquela Paz que reinava entre
os irmãos da igreja!
Ah, era simples a comemoração, mas comemorávamos o nascimento de
Jesus!
Ah, era uma vivência intensa de fé e de esperanças!
Ah, era a unidade que reinava entre todos do mesmo sangue ou não!
Ah, que
judiação! Sinto a necessidade de fortemente ressaltar que a atual
forma de comemoração do Natal – e também a fantasiosa passagem de
ano - tem sido Muito Cruel a cada ano que se passa - por mais
surrealista que soe, até mesmo entre as pessoas da mesma linhagem.
Creiam,
ainda que as pessoas não se percebam e/ou apercebam esse perverso
fato, ele está ocorrendo com muita regularidade! Com dores mais
fortes, imagino o que está a acontecer com as pessoas que não têm
mais parentes vivos nesta terra...
Infelizmente, também tenho que admitir que, se essa crueldade é auto
percebida e/ou vista ao longe, não tem sido totalmente verbalizada,
porque predomina na nossa sociedade o pensamento falacioso
pertencente à dominação: verbalizar em alta voz as feridas da alma é
ser uma pessoa fraca, dramática, louca etc.
Atentemo-nos ao pensamento: “O conhecimento serve para encantar as
pessoas. Não para humilhá-las” (Mário Sérgio Cortella).
São Paulo, 10.I.2016.
|